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Relato: estratégia das fases da Direction na Expedição Carcará

Redação Webventure/ Corrida de aventura

Direction vence após muito esforço (foto: Divulgação)
Direction vence após muito esforço (foto: Divulgação)

Dia 30/05/2010, 15:00 horas em ponto. Finalmente a ansiedade acabava. Iniciava-se o grande perrengue do ano, a Expedição Carcará 2010, 531 km. Pelo briefing do dia anterior sabia que a coisa não seria fácil. Pra falar a verdade seria bem difícil concluí-la sem cortes, mas quando fomos para o papel e mapas planejar nossa prova vimos que seria possível.

Nossa estratégia: dividiríamos a prova em fases, mas a quantidade de fases dependeria do nosso desempenho no início da peleja. Iniciar pela canoagem era tudo que queríamos, afinal estávamos com um time muito forte nesta modalidade. Bem, então vamos a prova. Largamos de Itajá para um pequeno trekking em busca do PC1 para iniciarmos a canoagem. PC e Cris partiram na frente para escolher os melhores caiaques. Eu e Edson seguiríamos mais atrás em um ritmo mais lento. Diríamos um “warm-up”. Batemos o PC1 em décimo lugar, 13 minutos atrás da Trotamundo. Mas como havíamos planejado, mandamos bem no primeiro trecho e já batemos o PC2 juntos com a Trotamundo. Agora era mantermos o ritmo em busca do PC3, uma longa perna de canoagem pela barragem Armando Monteiro, até Jucurutu.

O nosso forte ritmo fez com que os mineiros também forçassem o ritmo e assim que caiu a noite começou a parte não planejada da prova. O nível da barragem estava bastante baixo e o que pareceria uma navegação fácil em direção a Jucurutu tornou-se uma odisseia para nós.Apesar de mantermos sempre o azimute correto entramos diversas vezes em braços sem saída, alguns deles de mais de 5Km. Foi um verdadeiro bate e volta até achar o canal correto que estava bastante estreito em relação ao ano passado. Isso prejudicou bastante nossa prova pois apesar de chegarmos em quarto no PC3, estávamos a quatro horas dos Tapuias. Neste ponto definimos: a prova terá seis fases.

Fase 1: Atacar a Carbono Zero 02 – Iniciamos o trekking em direção aos PCV4 e PC5 conforme planejado. Um trote rápido por 8Km e depois todo o restante em trekking em marcha rápida. A essa altura nosso astro rei já dava seu sinal de que iria castigar a todos. Era nossa primeira “lua” e a adaptação teria que acontecer agora. Foi um trecho duro em terreno bem acidentado e seco. Uma vaca morta por uma cascavel foi o fato interessante no caminho. Bom interessante para nós não para a vaca. Foi duro, mas cumprimos o planejado.

No PC5 estávamos a meia hora da Carbono Zero 02. Continuávamos em Fase 1. Mas agora era a bike, sabidamente nossa melhor modalidade. Lembro que assim que peguei a magrela vibrei e disse: “Vamos galera, é agora a nossa vez”. Infelizmente logo na primeira subida nosso “monstro” Edson iniciou seu martírio. Foi uma série infinita de câimbras que fez com que nosso ritmo fosse igual ao de nossas avós. Acredito que um erro de alimentação ou ansiedade tenha causado isso. Mas o cara é realmente um “monstro”.

Apesar de tanta dor que sentia, foi forte e guerreiro e em nenhum momento pensou em desistir. A equipe se uniu e ajudamos no que pudemos e foi assim até o PC7. Como nosso ritmo não era forte, a navegação foi mais fácil e como esse trecho complicou para as outras equipes, acabamos não nos afastando muito dos líderes, mas ainda continuávamos em fase 1 e isso me preocupava pois para ganharmos a prova precisaríamos chegar a fase 6.
Para o PC8 foi mais tranquilo pois com o adiamento do corte para as duas da manhã não corríamos mais perigo de ser cortado.

Ao chegar no PC8 (AT) o Edson pediu 2 horas para se recuperar. E foi o que aconteceu. Durante todo o resto da prova ele esteve ótimo. Nem resquício dos problemas deste último trecho. Bem, voltando a prova, depois de um descanso, alimentados e fortes partimos para uma canoagem rápida seguida de uma natação revigorante. Estávamos no PC10 e iniciamos um trecho de escalaminhada de navegação bem difícil. Mas já estava amanhecendo e com força renovada subimos iguais a cabritos em montanha.

Para minha grata surpresa encontramos nosso alvo no meio da serra. A Carbono estava por lá. Conversa rápida, caminhos distintos e pronto, estávamos em fase 2. Era a hora de consolidar a vantagem. Mas, um vacilo na ida a um dos PPOs fez com que a Carbono nos ultrapassasse e voltamos a fase 1.

Finalmente descemos a serra até o PC11 e seguimos os 12Km de trekking até o PC12. O sol já rachava nossos juízos. Tanto que Cris desesperada em busca de água “gelada” partiu alucinada em trote até uma casa que segundo o fiscal do PC11 estava a 5 km de lá. 5Km depois estava lá Cris nos chamando que tinha encontrado a tal água. Bebemos e seguimos um pouco mais aliviado até o PC12. Saímos do PC12 ainda de trekking e logo em seguida encontramos a Carbono novamente. Novamente um papo rápido, pequena confraternização e iniciamos a subida para a Serra do Chapéu já na frente. Agora sim estávamos em fase 2.

O passo aumentou e a subida para a serra do chapéu foi vencida facilmente. A vontade de entrar na fase 3 – Caça aos Tapuias era imensa. Descemos a serra do chapéu em um trote rápido e encontramos os amigos mineiros da Brou. Estávamos descendo tão rápido que eles se enfiaram no mato para passarmos. Foi engraçado. Mas isso os animou e eles seguiram com a gente.

Mas aí cometeram um erro. Decidiram nos ultrapassar num trecho complicado de navegação. Subiram e desapareceram enquanto que nós entrávamos numa trilhinha bem escondida em direção ao cânion dos apertados. Descemos num vale de pedras soltas bem difícil para os joelhos e chegamos no rio do cânion. Estava completamente seco e ao contrário do que meu amigo Fregni tinha me dito, não dava para andar descalço. As pedras machucavam bastante os pés.

Durante esses 8 ou 10Km, não me lembro ao certo, pegamos um “toró” daqueles. Uma chuva tão forte que os pingos doíam quando nos atingia. Chegamos todo molhado ao PC14, o AT da soneca. Tomamos banho, comemos e dormimos. Precisávamos estar inteiros para a bike. Aqui quero agradecer aos nossos apoios que foram “quase” 100%. Fundamental para o sucesso do nosso andamento. Mas por que “quase” 100%. Esperem até o próximo AT e saberá…

Fase 3 – Atacar os Tapuias – Agora estávamos na bike novamente e desta vez com nosso “monstro” Edson totalmente recuperado. Estávamos motivadíssimos, todos inteiros e fizemos força. Muita força durante toda a noite para alcançarmos os líderes. Uma navegação quase perfeita e um estradão final de 10Km ou mais com uma média próxima de 30Km fez com que chegássemos ao próximo AT já amanhecendo a apenas 10 minutos dos Tapuias e ainda a tempo de ver a Trotamundo na transição. Pensei, vamos chegar a fase 6 sim. Nossa estratégia estava correta.

Olhei ao redor e surpresa! nosso apoio ainda não havia chegado. Esse foi um momento bem triste para nossa equipe. Alguns minutos depois víamos a Trotamundo partindo e em seguida os Tapuias. Não tínhamos o que fazer, era esperar. Decidimos nos alimentar com o que tinha por perto. O apoio da Trotamundo nos deu alguma coisa e outras compramos na cidade. Aproximadamente uma hora depois nossos apoios chegaram. Comemos mais um pouco, preenchemos as mochilas e partimos.

No início desse trekking em direção ao PC23, em Santa Cruz, falei pra equipe. É hora de fazer muita força. Se não fizermos esse trekking entre 8 e 9Km/h não passaremos pelo corte. Parti na frente puxando o ritmo com uma vontade que vinha além de mim. Não sabia que tinha ainda essa força para fazer um trekking tão forte. Olhava no semblante de todos e via a expressão de dor e cansaço.

Fizemos esse trekking contra o relógio. No início tinhamos 35 minutos de folga. A medida que o tempo passava a folga diminuía e quando chegamos próximo a cidade de Santa Cruz faltavam apenas 15 minutos para o corte. Ao subirmos pelo asfalto, visualizando o PC, não me contive e as lágrimas desceram. Falei pra mim mesmo: Conseguimos!

Neste PC quase fomos expulsos. Tinhamos apenas 10 minutos para carregar a mochila, comer, preparar para a bike e partir. Estávamos esgotados e decidimos parar logo a frente para descansar. Nossos amigos Tapuias também fizeram o mesmo. Meia hora depois partimos, paramos antes num posto e comemos alguma coisa rápida e seguimos para a Serra dos Tapuias. Coincidência ou não foi lá que ultrapassamos nossos amigos e entramos em fase 4.

Descemos a serra dos Tapuias em direção ao próximo AT. Foi bem rápido. Chegando lá tivemos que fazer novamente uma transição rápida, pois ainda tinhamos que passar o próximo corte (terceiro).

Iniciamos o trekking novamente contra o relógio. O sol não nos castigava mais, era noite, mas o trecho era bem grande e um sobe e desce danado. Optamos por iniciar mais leve e no meio da noite apertar o passo. Foi o que fizemos e conseguimos chegar 25 minutos antes do corte. Pelo que percebi dos Tapuias, dificilmente eles passariam desse corte. Então entramos em fase 5.

Fase 5 – Atacar Trotamundo – Quando chegamos no AT que dava início a pista de orientação, local do corte, soubemos que a Trotamundo ainda não tinha subido a serra e chegado no rapel. Estávamos próximos. Fizemos uma rápida transição e iniciamos a pista de orientação. Eu e PC nos atrapalhamos um pouco nas idéias (vale salientar que nossa equipe teve poucas divergências para uma prova tão longa como essa), mas depois nos acertamos e chegamos no rapel. O último integrante da Trotamundo tinha descido fazia 10 minutos. De cima ainda consegui ver suas head-lamps em direção ao próximo AT.
Bom agora era curtir o Rapel Guiado, por sinal um lugar maravilhoso, pena que fizemos a noite. Acredito que durante o dia a vista seria fantástica.

Finalizado o rapel seguimos até o AT. Estávamos a 56 minutos da Trotamundo. Era o momento de pagar 4 horas de sono. Por sinal muito bem vindo naquele momento.
De olho no relógio, partiríamos às 6:19 enquanto que a Trotamundo às 5:15.
Quando acordei a Trotamundo já estava se preparando para partir. Pensei: “É agora ou nunca”. Precisávamos encostar para decidirmos a prova no trecho final. O problema é que a navegação não era tão difícil e uma hora de sol a mais pra gente faria diferença.

Iniciamos com a bike bem forte até um PCV passando por um PPO. Passamos tão rápido pelo PPO que só notei 4 km depois. Pensei, será que tinha alguém lá? Decidimos voltar e não arriscar. Voltamos e não tinha ninguém, mas a nossa consciência estava tranquila para continuarmos. Seguimos em ritmo forte até o PC31 com algumas pausas nas cidades no meio do caminho para beber e comer. O ritmo era forte e precisávamos repor as energias.
Quando chegamos no PC31, uma ducha fria. Trotamundo aumentara a distância para 2 horas. Pensamos em conjunto: duas horas a frente sem navegação complicada, com grande possibilidade de eles chegarem a Macaíba e pegarem os caiaques com a maré a favor e nós contra, decidimos: vamos diminuir o ritmo e contar com a sorte. Era o que nos restava a fazer.

Ao chegarmos em Macaíba o tempo já era de 3 horas e a maré já tinha virado contra nós. Aí paramos, comemos um peixe frito e um açaí daqueles. Parabéns novamente aos nossos apoios. Daí pra frente foi só curtição: fizemos a canoagem contra a maré, chegamos em redinha, fizemos o trekking andando até as dunas para iniciar a pista de orientação.
A pista de orientação foi espetacular e bem técnica e já no final caiu outro “toró” que nos fez parar uma hora dentro da pista para evitar que Cris tivesse hipotermia. Todos juntinhos…uma beleza! Ainda bem que ninguém sentia o cheiro do outro. Imagino a catinga que estava naquela roda.

Terminada a pista era hora de ir para a chegada. A chuva que só nos perseguia a noite não deu trégua. Durante todo o trecho final de bike ela nos acompanhou lavando nossas almas e corações e realizando um sonho de cumprir a Expedição Carcará 2010 inteira, sem nenhum corte e em segundo lugar.

Apesar em não termos conseguido chegar a fase 6, cumprimos nossa missão! Obrigado a Cris, Paulo César (O PC), Edson, Radamés e Renato. Parabéns aos mineiros da Trotamundo, aos nossos amigos Tapuias, aos Carboninhos (foi assim que carinhosamente os apelidamos durante a prova), as demais equipes que participaram dessa aventura, ao pessoal da imprensa pela excelente cobertura e aos nossos amigos Toinho e Véscio por mais uma brilhante prova.

Este texto foi escrito por: Jairo Martins Marques, especial para o Webventure

Last modified: junho 11, 2010

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