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Veja como foi o bate-papo com Vitor e Rodrigo

Redação Webventure/ Montanhismo

A dupla de alpinistas Vítor Negrete e Rodrigo Raineri, que escalou o Monte Aconcágua pela face sul, esteve no bate-papo do Uol nesta segunda-feira (28/01) a convite do Webventure. Durante uma hora, eles responderam a muitas perguntas dos internautas. Estiveram presentes no chat 120 pessoas e agora você pode ler, na integra, como foi o bate-papo.

No Aconcágua…

A que horas vocês acordavam para escalar? E a que horas vocês dormiam?

Dependendo do dia, acordávamos às 4h. Às vezes não dormimos… foi realmente uma escalada penosa

Em algum momento na escalada vocês pensaram em desistir?

Nunca pensamos em desistir. Nós sempre pensávamos em como iríamos ultrapassar o próximo obstáculo.

Teve alguma hora que um de vocês parou e pensou “o que eu estou fazendo aqui”?

Sabíamos muito bem, afinal, nós escolhemos estar lá. Pensávamos nos próximos obstáculos.

Qual a temperatura quando vocês chegaram ao cume do Aconcágua?

Quando chegamos ao cume, por volta das 20h, a temperatura estava na casa dos 25 graus negativos.

E como congelou as mãos e os pés?

Durante a descida, estávamos desidratados, após mais de 40 horas de atividades ininterruptas, e paramos para dormir. Não tínhamos mais combustível para o fogareiro, de forma que não poderíamos derreter gelo para fazer água nem secar as roupas encharcadas. Dormimos e acordamos com as extremidades bem maltratadas e continuamos a descida sob tempestade novamente…

Qual foi a parte mais difícil da escalada?

Tivemos muitos momentos difíceis. A escalada é muito complexa o tempo todo. Foram 7 dias! Talvez o mais difícil foi passar a noite molhados, pendurados na cadeirinha, a 6.700 de altitude.

Qual foi a sensação ao encontrar o corpo dos dois alpinistas mortos há anos e não há a possibilidade de tirá-los de lá?

É muito difícil responder esta pergunta, pois temos poucas palavras para expressar nossos sentimentos! Não foi bom. A possibilidade de um resgate é um assunto que poderíamos discutir com os familiares…

De que modo é feita a descida?

A descida, uma vez que você consiga atingir o cume, é pelo outro lado, pela face noroeste, a famosa Via Normal. Descemos caminhando desta vez. Mas na tentativa anterior, quando estávamos a 6.000 metros e resolvemos descer, foram 20 horas de descidas ininterruptas, das 10h de um dia até às 6h da manhã do dia seguinte, com seqüências de rapéis incríveis e dificílimos, com amarrações ruins e duvidosas.

O que pegou pesado naquela altitude? O ar rarefeito? O esforço físico? Medo? Solidão?

O tempo (clima ) ruim. As tempestades podem nos soprar para fora da montanha como folhinhas de uma árvore.

O que vocês levaram, basicamente, como alimentação? Vocês perderam muito peso? Já conseguiram se recuperar?

Levamos comidas liofilizadas (sem água) para os jantares (de sete noites jantamos quatro), e durante o dia levamos gel de carboidratos, barras energéticas e protéicas e barras de cerrais Brunch. Perdemos aproximadamente 5 kg cada um e já estamos recuperados. Os dedos é que ainda estão recuperando…

Vocês tinham algum tipo de comunicação lá?

Conversávamos com a base via rádio, que nos colocava em contato com o mundo via telefone satelital. Conversava com minha esposa e ouvia meu bebê todos os dias.

O que os encanta nessa profissão?

O que mais nos encanta é conhecer lugares novos, pessoas e culturas novas, o contato com a natureza e principalmente o auto-conhecimento, os valores e a auto-superação, com desafios audaciosos, como este que acabamos de realizar!

Sabendo dos riscos do esporte o que diriam se seus filhos algum dias quisessem seguir essa mesma profissão?

Nós diríamos: Uhu, ou Yes, ou Vai lá!!! Manda bem! Obviamente, com muito cuidado, consciência e paciência, para não dar um passo maior do que perna.

Quando e por que vocês decidiram escalar o Aconcágua?

Desde 1993 conhecemos o Aconcágua pela via normal. Em 96 começamos a namorar a parede. É um super desafio. Para encarar a Face Sul você tem que ser completo, em rocha, gelo, móveis, e altitude. É um super desafio! E isso nos encanta…

Quanto tempo vocês demoram pra formular o projeto?

Para formular, 6 meses e mais um ano de preparos. Depois da primeira tentativa, mais um ano. Mais de dois no total… o projeto sempre vai sofrendo modificações…

O que vocês fazem pra manter a calma?

Há tipo de treinamento que chamamos de psicológico. Imagine você em situações altamente desesperadoras, mas imagine com detalhes, o frio, o ruído do vento, as pedras caindo, etc. Então mantenha a calma e supere isto! Funciona muito! Outra coisa que as pessoas devem fazer é realmente conhecer seus limites para poder saber até onde vai conseguir manter a calma…

Houve muito treinamento, e como é a rotina de treinos para suportar tamanha proeza?

Treinamos muito musculação, natação, escalada em rocha, escalada em gelo na Bolivia, bike, etc…

Qual o próximo desafio que vocês pretendem encarar???

Estamos agora no projeto Everest sem Oxigenio! Vai ser radicalíssimo!!!

Como está hoje a vida da dupla, quais são os projetos e quais as perspectivas futuras?

Estamos dando muitas entrevistas e preparando o projeto do Everest sem o2. O Rodrigo trabalha também na GradeVI e eu trabalho na Unicamp como pesquisador.

Vocês não têm medo de morrer?

Obviamente que não! O nosso maior medo é ver a vida passar e olhar para trás e descobrir que não fizemos nada porque tivemos medo. Lembra-se do poema do Jorge Luis Borges?

Eu li em uma matéria no Webventure que dizia que a parede sul era a mais difícil, pois era um misto de rochas e gelo, por que isso?

Na escalada, como em outros esportes, há vários graus de dificuldade. A composição do terreno, a inclinação, a qualidade das proteções, as dimensões da parede, a altitude. Tudo isso e outras coisas somadas fazem com que uma escalada seja mais difícil do que a outra.

Vocês estudam muito sobre o local antes de escalá-lo?

Sim. Estudamos, fotogramos, conversamos com uma dupla de argentinos que já havia subido, etc…

Quando vai ser o próximo desafio?

Em abril/maio de 2003. No Himalaia!!!

Curiosidades…

Vocês fizeram faculdade do que?

Eu, Rodrigo, me formei em engenharia de computação e o Vitor em Engenharia de Alimentos. O Vitor fez mestrado em Tecnologia de Alimentos.

Como vocês identificaram o dom para o alpinismo e como conseguiram abrir as portas para os patrocínios?

Bem, o dom você descobre fazendo, deixando o gosto pelas coisas levar o seu modo de vida. As portas para os patrocínios estão sendo abertas agora, pois até então nossos projetos foram financiados por nós mesmos!

Qual a faixa etária que se pode ou deve começar a praticar esse esporte?

Achamos que se deve começar desde criança, mas o mais importante é ter prazer naquilo que está fazendo, portanto realmente não uma regra…

Quais são os seus ídolos?

Chico Mendes e outras pessoas que lutam para melhorar a vida de todos.

Vitor, Conta pra galera aquela história do assalto que você sofreu, e um zíper salvou sua vida….

Eu levei um tiro de uma 380, quando roubaram minha moto e a bala – pasmem – bateu exatamente na fivela da pochete. Acho que meu anjo da guarda deve ser triatleta…

Este texto foi escrito por: Camila Christianini

Last modified: janeiro 30, 2002

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