Foto: Pixabay

A descoberta de Mallory (parte 1)

Arquivo/ Montanhismo

Tibet – Menos de uma semana depois da descoberta histórica do corpo do alpinista britânico George Mallory, desaparecido no monte Everest em 1924, Dave Hahn, integrante da expedição “Mallory & (Andrew) Irvine Research”, dá um relato completo de todos os momentos da busca diretamento do acampamento base da montanha mais alta do mundo. A Webventure vai publicar a história em duas partes. Na primeira, as pistas que levaram os alpinistas a ter certeza que iriam descobrir algo e calar a boca de todos que os haviam criticado por “procurar agulha no palheiro”.

“Foi um certo alívio chegar aos finalmente no último dia 3. Pela manhã do dia seguinte, quando chegamos ao acampamento base, um cara já veio nos cumprimentar dizendo ter ouvido falar da descoberta de George Mallory na BBC World News, pelo seu radio de ondas curtas. A gente não tinha dito uma palavra a ele ou a qualquer um das centenas de alpinistas que encontramos durante a descida e a noite no acampamento VI. Foi estranho e difícil se tornar, de um dia para outro, o principal foco de atenção no local.

Quando nossa própria “notícia” voltou de seu giro pelo mundo, a gente estava se preparando para deixar o acampamento VI para o base. Descemos o vale orgulhosos, claro, mas um pouco preocupados com a responsabilidade que tínhamos nas mãos. Tínhamos acabado de escalar cerca de 8.200m, o que não é nada tão incrível (tirando o fato de que não existe ar suficiente aqui para subir tão alto). Mas escalar se transforma em outra coisa quando se trata do Everest.

Meu palpite é que passamos nossos 15 minutos de fama lá mesmo nas rochas do lado leste Rongbuk, quase sufocados. Ninguém parecia capaz de falar, sentamos nas nossas mochilas tossindo e pigarreando como se faz quando a sua garganta está danada por tantos dias no ar frio e seco, que eu nunca vi pior.

Heróis eternos – Quinze minutos de fama é provavelmente uma coisa muito legal, mas não é nada comparável aos 75 anos de fama de George Mallory. Talvez esta seja uma das coisas que fez nosso encontro com ele tão especial. Foi como voltar ao tempo em que os homens eram diferentes e a sociedade poderia elevá-los ao status “heróis eternos”. Não foi um encontro ao acaso. Fomos a alturas extraordinárias para revirar a história. Estávamos preparados para procurar muito e não achar nada. Era o resultado mais provável de uma busca num lugar tão selvagem. “Procurar agulha no palheiro”, soando como uma dica esperta, foi a definição mais ouvida para nossa aventura.

Mas às 3 horas da manhã do último dia 1º, quando Andy começou a chutar minhas costas, para me acordar a uns 8.200m, nada parecia com aquele conselho pessimista. Estávamos tão comprometidos com aquilo que considerávamos o momento como a tentativa de chegar ao cume. A primeira costela chutava por Andy fez eu me mexer e parte da minha máscara de oxigênio caiu, expondo meu pescoço ao frio. Aquilo me fez levantar num instante. Peguei o rádio e acordei definitivamente. O Conrad respondeu ao meu chamado na hora. Ele, Jake e Tap estavam no nosso acampamento V só que parecia que eles estavam num outro país.

Às 5h da manhã estávamos prontos para andar, então chamei o acampamento base para avisá-los. Procurando pelos meus companheiros, percebi que eles tinham se separado, cada um subindo a sua maneira. Conrad estava sem a máscara de oxigênio, apenas levando garrafas na mochila. Era a primeira vez que ele chegaria naquela altitude, então ele estava se testando. Para mim era a quarta vez nos últimos oito anos que faria a jornada do acampamento V para o VI. A familiaridade parece fazer com que aquilo se torne fácil, mas achei a subida muito difícil e tediosa. Não havia neve. Andy tomou a direção esquerda, a da face Norte. Aparentemente ele decidira investigar pessoalmente a ponto em que Noel Odell viu Mallory e Irvine pela última vez. A procura tinha começado.

Como não achar Irvine? – Depois de uma subida puxada, a vida pareceu muito boa assim que pulamos para o campo VI e nos sentamos juntos no chão, às 10h. Todos estavam muito ansiosos para saber o que viria a seguir. Jochen tinha, por todos esses anos, elaborado um plano de busca para achar o corpo Andrew Irvine. Muita gente aceitou a versão de que um alpinista chinês tinha visto seu corpo em 1975. A história era de que o cara tinha encontrado “um velho inglês morto”, a 20 minutos do acampamento VI de 75. A história sempre me intrigou mas, se fosse verdade (o chinê morreu em 78, no Everest, pouco depois de contar sua descoberta a um alpinista japonês), a chave do mistério era localizar o acampamento de 75.

Não demorou muito para que Jake encontrasse uma das garrafas azuis de oxigênio que Jochen nos disse que
os chineses usaram naquele ano. Cobertos com um pouco de neve, sentimos o otimismo crescer. Como não achar Irvine?”

Last modified: maio 7, 1999

[fbcomments]
Avatar
Arquivo